sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010
SOBRE O SACRIFÍCIO
Kléos(a última) segura na ponta da agulha
o que restou das palavras.
É muda a musa.
Sua boca sopra por entre os vão dos corpos
na eminência da queda,
ao redor das horas,
o gesto vazio
costura o silêncio,
fura o tecido do engano.
Penélope ao aveso,
nada espera.
Tentáculos se distendem sob a carne do oceano.
Irael - 03/07/2009
Irael me presenteou com esse poema após ter participado da performance " A Costura do Invisível"- na Oficina Osvald de Andrade.
quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010
DEPOIS DO SAGRADO, A PROFANAÇÃO
Foto: Fabiola Chiminazzo
Entro pelo corredor, avanço em direção à luz violeta e olho pela abertura de entrada. O piso está coberto de tinta vermelha. Na mesa, mais tinta derramada. Duas circunferências desenhadas no chão, uma vermelha e outra preta. Bancos com traços apressados de tinta, o bordado feito pela Lilian no dia anterior irreconhecível, encharcado com tinta guache. Paredes e mapas pichados.
Volto meu olhar para as pessoas, e todos ali meio passados… A Cabana sofrera um atentado.
E nem fazia muito tempo, já que a tinta ainda estava fresca. Suponho que os perpetradores tinham pressa, dada a timidez do ataque. Muito frouxo. Destruir também não é fácil e demanda tempo e profissionalismo. Amadores prestam um serviço muito ruim. Mas é muito curioso o tipo de reação que a Cabana provoca. Ela exerce um fascínio tão grande que alguém não consegue se conter e invade um lugar para depredá-lo, sem se dar conta que este gesto trai o desejo recalcado de PARTICIPAR daquilo que se está destruindo.
Conversamos um pouco, e passamos a limpar a sujeira. Em pouco tempo, já não se podia saber do que havia ocorrido. Simples assim. E o bordado da Lilian foi erguido e transformado num estandarte.
Hoje, a Cabana tem um nome, tem um estandarte; tem um objeto bruto, que foi construído rápida e furiosamente e que é agora um símbolo (um símbolo dentro de outro símbolo). Um monumento e uma cifra.
Pareceu-me que estávamos tornando concreta a poesia primeira, aquela que antecede a fala. Um objeto bruto, que se recusa a apenas representar algo (isso seria sacrilégio). O totem que foi erigido É a própria coisa. É a lacuna materializada. Nós sabemos que é isso.
Terminado tudo, ficamos ao redor do obelisco, olhando para ele, feito os hominídeos de 2001.
Num dia, o sagrado. No outro, a profanação.
Pois foi a profanação que propiciou a materialização do sagrado. A materialização do silêncio que antecede o entendimento e a aceitação.
http://oficinadacabana.wordpress.com/2009/07/05/dia-16-sexta-feira-030709/
quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010
A COSTURA DO INVISÍVEL - Cabana Solaris
O silêncio branco do papel é diferente do silêncio do espírito sagrado. Este pode ser muito ruidoso e assustador. Pode proporcionar a possibilidade de muitas sinestesias: evocar calor ou frio, fazer perceber melhor as variações dos cheiros, das texturas das coisas que tocam os corpos. O silêncio do espírito sagrado amplifica os sentidos.
A performance que consagrou a Cabana, assim me pareceu. Talvez uma espécie de cerimônia-ritual para marcar seu nascimento espiritual.
Quando cheguei, a Lilian preparava o ambiente. Cobria de branco os bancos e a mesa, mapeou um caminho com papéis brancos. Fazia essas coisas com grande cuidado. Todos na Cabana em silêncio. Preparado o ambiente, ela começou a preparar-se. Um belo espetáculo, que se relaciona muito com os as duas palavras, ou cifras, que são repetidamente discutidas ali: embodied e umwelt.
Essa é a descrição mecânica do evento.
Outras postagens relacionadas a este trabalho :
o silêncio do acontecimento
verbo
depois do sagrado, a profanação
sobre o sacrifício
sustentando o tempo ponto por ponto
saiba mais sobre o processo da Cabana Solaris através do link:http://oficinadacabana.wordpress.com/2009/07/05/dia-15-quinta-feira-020709/ ).
O SILÊNCIO DO ACONTECIMENTO...
Cada um que subiu, que entregou a sua palavra e se entregou à Lilian, o fez do modo diferente.
Eu percebia o tempo como algo muito ligado ao silêncio das pessoas ali presentes, e era um silêncio de se perceber fazendo parte de uma cerimônia inaugural. O silêncio de ser nomeado. O silêncio do espírito consagrado.
Não houve discussão teórica nesse dia, nem houve construção.
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(VIVER – PULSAR – VERBO – LUZ – VERMELHO – RELAÇÃO – AR – CORTE – ME ESQUENTA)
quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010
VERBO - Rubens Espírito Santo
nota de Giovanna Guerra Nogueira sobre o Dia 15:
(Passagem perdida do relatório: Ápice da quinta feira – Rubens sobe na mesa. O ritual que antecede a subida já é por si só mágico. Por um momento Rubens brinca com o pedaço de linha que escolheu, como se estivesse pintando o caminho para a subida. De repente, ele se dá conta que o tamanho da linha é exatamente o comprimento existente entre seus braços abertos. Neste momento ele se ajoelha por alguns instantes, e deita-se no chão de barriga para baixo em forma de cruz com a linha percorrendo o espaço entre um braço e outro.
Quando Rubens sobe é maravilhoso, ele toma conta da Lilian, atravessa-a, por um momento penso que ela não aguentará sua intensidade. É um momento de puro êxtase. Lindo, mágico, um milagre. E para finalizar, como que para agradecer a fortaleza de suportar aquele corpo tão intenso sobre o seu, Rubens se ajoelha aos pés de Lilian e fica ali por alguns minutos e ela em resposta se debruça sobre ele. A palavra: VERBO).
http://oficinadacabana.wordpress.com/
segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010
CABANA EXTEMPORÂNEA
A Cabana Extemporânea opera como lapso do tempo, onde todas as orientações são ao mesmo tempo ausentes e possíveis. Ο experimento Cabana Extemporânea resiste como espaço de potencialização plástica e psicológica: redemoinho antropofágico, nele os náufragos-ocupantes se sustentam entre os destroços daquilo que resta de suas vidas após se lançarem à viagem. Depois de dois meses de ocupação, que geraram momentos de intuição e plena consciência do ser, o sacro-oficio artístico espelha-se no corpo e na obra do grupo. Na transformação das pessoas e do espaço, transparece a chave desse grande aprendizado coletivo, escultura social que emerge em meio ao caos: a partir de mutuas apropriações e desapegos de seus egos onde pensamentos fundem-se em um. O pulo do gato que foram obrigados a dar sobre si mesmos. A experiência conta com o apoio caloroso do presidente nacional instituição, o ator Sergio Mamberti, e permanece aberta ao público até o dia 28 de fevereiro. O fim da Cabana Extemporânea em São Paulo é o seu começo enquanto projeto a longo prazo: a ocupação se desloca para a Serrinha, em Bragança Paulista, a convite de Fábio Delduque e em seguida, a convite de Patrícia Bowles, segue para o Espaço Apis no Rio de Janeiro.
quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010
MALÉOLOS
mas para viver
é preciso ser alguém
e para ser alguém
é preciso ter um OSSO,
é preciso não ter medo de mostrar o osso
e arriscar-se a perder a carne.
(Antonin Artaud - Para Acabar com Julgamento de Deus)
A performance "Maléolos" foi realizada na noite de 03 de dezembro de 2009, na Galeria Mário Schenberg/ Funarte-SP, por ocasição da abertura da exposição Entorno de- Nos Limites da Arte - Cabana Extemporânea de Rubens Espírito Santo.
http://diariodacabana.wordpress.com/?s=lilian+soarez
Registro de um breve diálogo que tive com Amanda Mendes, um pouco antes da realização da performance:
Amanda: - Qual é o tema?
Lilian: - Maléolo
Amanda: - Maléolo!? Vem de mal?
Lilian: -Não, vem de osso!
Amanda: -De que parte?
Lilian:- Nós temos quatro no nosso corpo.
Amanda: - Onde?
Lilian: Você vai descobrir...
Fotos: Fabiola Chiminazzo